sexta-feira, 22 de junho de 2018

quando a sociedade deixará a mulher amadurecer naturalmente?

   Você já parou para pensar no jeito distorcido que as mulheres amadurecem na nossa sociedade? Primeiro esperam que elas pareçam e hajam como se fossem mais velhas do que são, depois as tratam como se elas devessem parar de envelhecer.
   Quando falamos sobre o jeito que as mulheres são tratadas na nossa sociedade, nada realmente mudou, apesar do não tão recente debate sobre os direitos das mulheres. O grande esquema ainda é o mesmo de décadas atrás; meninas são ensinadas a ser frágeis e fúteis. Do momento que uma mulher nasce, lhe dão roupas e brinquedos que deixam claro seu papel no mundo. De bonecas em forma de bebês a kits de cozinha e maquiagem em miniatura, a mensagem não está nem oculta mais. Elas vão aprender a cozinhar, a cuidar de bebês, a ser bonitas em roupas que não são confortáveis o suficiente para permitir que participem de brincadeiras que exigem agilidade e um espírito aventureiro.
Como a Paula Hawkins colocou em seu livro de estréia, "A Garota No Trem": "sejamos honestos: as mulheres continuam sendo valorizadas de verdade apenas por duas coisas — sua aparência e seu papel como mãe".
   Enquanto meninos são instruídos a ser fortes, independentes e espertos, meninas ainda são instruídas a crescer e encontrar um "bom homem" para cuidar delas.
As crianças de hoje em dia crescem muito rápido, graças ao ambiente estressante em que nós vivemos, e mesmo por causa da comida cheia de hormônios que consumimos atualmente. Uma garota de 14 anos hoje provavelmente não parece com uma garota de 14 anos de duas décadas atrás. Será que as pessoas realmente entendem o perigo disso?
Quando meninas entram na pré-adolescência e na adolescência em si, os hormônios femininos entram na equação. Além de toda a construção de personalidade através dos anos, elas também começam a se sentir diferente, e a copiar o comportamento de suas referências da indústria do entretenimento. Passam a desejar ser vistas como mulheres.
   E para alcançar este desejo, elas precisarão se vestir de uma forma mais provocante, e fazer coisas que atrairão olhares e desejos que elas não poderiam entender mesmo que tentassem muito. Uma vez que elas atraem esse olhar, se sentem quase satisfeitas, porque pensam que é exatamente isso que elas querem. Mas na verdade, elas não têm estrutura emocional para sustentar essas coisas. Elas se sentirão únicas enquanto conversam com caras mais velhos, pensando que estão impressionando com sua "sabedoria" precoce, sem perceber que estão sendo usadas. Homens amam isso. Eles são obcecados com a combinação de luxúria e inocência. Mesmo os mais pretensamente "honestos" amam quando garotas agem como se fossem adultas, porque isso lhes dá mais uma desculpa. Por um momento ou dois, eles podem fazer e falar o que quiserem, e fingir que não estão fazendo nada de errado, porque essas meninas "não aparentam a idade que têm".
   Essa é apenas a nossa garota "comum", a garota que não está sob holofotes.
   Agora vamos pensar nas mulheres NA indústria do entretenimento. Não apenas elas estão no meio dessa loucura coletiva, também estão constantemente expostas. As pessoas olham para elas de muitas formas. Elas TÊM que ser bonitas — obviamente, magras e femininas —, ou serão destroçadas, primeiro por colunas de fofoca, depois pelo público. Elas têm que se comportar de uma determinada forma. Suas imagens e suas vidas estão sendo exploradas na frente do mundo inteiro, e as pessoas não ligam para o fato de que essas garotas não sabem — não poderiam saber — como lidar com toda essa pressão. Seria difícil até para adultos lidarem.
   Então, nós temos garotas instruídas a agir como mulheres adultas para a satisfação masculina. Da cantora pop Britney Spears para a estrela da Disney, Demi Lovato, a maioria das garotas na indústria tiveram suas vidas quase que completamente arruinadas pelas expectativas da sociedade de como uma garota deve se comportar. Primeiro a sociedade sexualiza essas meninas, depois diz que elas são muito promíscuas. As condena. Incapazes de entender este paradoxo ou caber no molde social 24 horas por dia, pressionadas por empresários, familiares, e até mesmo pelos fãs, muitas dessas garotas acabam cedendo sob o peso disso tudo. Muitas recorrem a substâncias entorpecentes, desenvolvem transtornos alimentares e caem no abismo da depressão. Sendo tratadas, apesar da pouca idade, como objetos sexuais, elas irão, provavelmente, se deixar usar por pessoas, tentando preencher o vazio interior ou mesmo porque querem continuar sendo "gostadas".
   Alguém poderia dizer que é assim que a indústria do entretenimento funciona, que a pressão é colocada sobre todos trabalhadores do meio. Mas, exceções a parte, este seria um argumento desonesto.
   Podemos olhar para o elenco principal de Harry Potter, por exemplo. Enquanto o Daniel Radcliffe foi tratado como qualquer outro garoto, no que diz respeito a sua imagem e sexualidade, Emma Watson foi transformada em símbolo sexual muito antes de ser legalmente adulta. Enquanto Rupert Grint foi tratado como um garoto bobo, e retratado assim em ensaios fotográficos, A Emma Watson teve que vestir roupas provocantes e posar de forma sensual para câmeras. Enquanto seus colegas de trabalho tiveram permissão para ser "apenas garotos", ela foi sexualmente objetificada pela mídia. Felizmente, a Emma Watson é uma das celebridades que de alguma forma passou por esta experiência sem sucumbir. Ela agora luta pelos direitos das mulheres.
   A vítima mais recente da impiedade da nossa sociedade contra mulheres, é a atriz mirim Millie Bobby Brown, estrela da série de TV "Stranger Things". O mesmo que aconteceu com Emma Watson se repete com ela. Apesar de ter 14 anos, é difícil olhar para ela e ver uma adolescente.
   Também temos exemplos disso no Brasil. Larissa Manoela, atriz do SBT, atualmente tem 17 anos, mas sua sexualidade tem sido discutida por anos, por revistas de fofoca e por pessoas comuns. Ela começou nas novelas do SBT quando era uma criança, mas logo passou a mostrar um desenvolvimento corporal precoce. Aos 15 anos ela havia tido pelo menos 4 namorados. Algumas pessoas brincam sobre sua vida amorosa, enquanto outras fazem comentários vulgares. 
   Também a comparam à sua colega de trabalho, Maísa. Ambas têm a mesma idade. Enquanto Larissa Manoela recebe escárnio por ter muitos "lances", Maísa costumava receber escárnio por não ter tido nenhum namorado. O apresentador de televisão, e EMPREGADOR de ambas, Sílvio Santos, chegou ao cúmulo de ridicularizar as duas em rede nacional, comentando sobre a falta de "ação" de Maísa, e ao mesmo tempo afirmando que a Larissa Manoela "não é tão inocente quanto a Maísa". As pessoas não apenas julgam essas duas garotas pelo que as diferencia, como tentam criar rivalidade entre elas.
Chloë Moretz é mais um exemplo de como a sociedade funciona em detrimento das mulheres. Ela começou sua carreira quando tinha 8 anos, em 2005. Através dos anos, ela foi literalmente perseguida por predadores sexuais. Era fácil achar comentários de homens dizendo que mal podiam esperar que ela fizesse 21 anos (maioridade nos E.U.A), ou mesmo ameaçando-a de estupro. Isso também aconteceu com a Maísa. Pessoas (homens, é claro), se sentiram confortáveis o suficiente para dizer isso na frente de qualquer um com acesso ao Twitter. Como se essas garotas não fossem humanas cheias de medos e emoções. Como se fossem objetos.
   E é assim que a mulher é vista na nossa sociedade. Há muitas gerações de trabalhadoras da indústria do entretenimento permanentemente marcadas pela hipersexualização da mulher na mídia. Algumas delas lentamente desaparecem, a força ou por escolha. Algumas continuam a jornada.
   Quando estas garotas se tornam mulheres, elas se tornam menos interessantes para a indústria. Mulheres na casa dos 30 são colocadas para interpretar personagens mais jovens. Não é incomum ver atrizes adultas interpretando adolescentes, especialmente em séries de TV. Elas têm que agir como menininhas inocentes em corpos completamente desenvolvidos para, de forma selvagem, representar como as adolescentes são na imaginação dos homens. Isso também é parte do "efeito Lolita", só que sem a culpa de DEMONSTRAR desejos sexuais por pré-adolescentes de fato.
   Quando essas mulheres atingem os 40 anos, elas não têm mais serventia nenhuma para a indústria, e para a nossa sociedade, de forma geral. O apelo sexual se perde completamente. Elas não cabem mais nas fantasias dos homens. Como mulheres mais velhas são retratadas em filmes? Há basicamente dois extremos: como a dona de casa insegura, frágil e submissa, ou como a pessoa frígida que abdicou de sua vida amorosa e sexual para ter uma carreira de sucesso. Porque mulheres não podem ter tudo. Elas são desagradáveis, mandonas e amargas, especialmente contra mulheres mais novas. É assim que a mídia promove inimizade entre mulheres mais novas e mais velhas. Elas não podem ser amigas e dar apoio umas às outras, porque precisam competir.
   Chegando aos 50, as mulheres basicamente não têm permissão para existir mais. Não podem ser sexy. Na verdade, se TENTAREM ser, soarão desesperadas. Serão zombadas pela sociedade.
   Atrizes mais velhas tem paparazzi nas suas costas, mostrando pro mundo inteiro o quão imperfeitas elas se tornaram. Muito peso, muitas rugas, muita flacidez... Do outro lado, homens são vistos como uma boa garrafa de whiskey: quanto mais velhos, melhores. 
   Enquanto mulheres mais velhas são empurradas para fora da indústria do entretenimento, homens mais velhos são os galãs, os conquistadores, sempre atraindo mulheres bem mais jovens. A disparidade de idade em muitos pares românticos no cinema é ultrajante, e a cada ano que passa se torna mais evidente. Mulheres entrando nos 20 anos são postam para protagonizar ao lado de homens de 40 ou 50 anos. É muito raro vermos casais de pessoas mais velhas no cinema. E, pior, um casal onde a mulher é nova e o homem é mais velho é visto como algo completamente comum, mas se for uma mulher mais velha com um homem mais novo, as pessoas se sentem enojadas.
   Pressionadas pelos padrões estéticos vigentes, e numa tentativa de continuar relevantes para a indústria, mulheres tentarão, mais uma vez, se encaixar. Elas se entregarão a HOMENS com bisturis, porque acreditam que eles as tornará "perfeitas" novamente. 
Só que muitas vezes o efeito é nulo, e essas mulheres se tornam alvo de ainda mais violência verbal. Como Courtney Love, que, após passar por muitos procedimentos estéticos, recebe milhares de comentários rudes sobre sua aparência e sua tentativa de "não envelhecer".
   Apesar de a televisão ser um pouco mais aberta à figura da mulher chegando aos 40 ou mesmo acima disso — séries de TV como "A Paranormal", "The Closer", "Amor Imenso", "Estética", "A Sete Palmos" e muitas outras tiveram mulheres mais velhas retratadas de formas mais complexas e desafiadoras que a maioria dos filmes até hoje —, ainda é um privilégio para poucas. As atrizes nessas séries são conhecidas há décadas, e também tiveram sua cota de exploração de juventude. Elas tem prestígio.
   "Pediram" a Patricia Arquette, por exemplo, que ela perdesse peso para interpretar sua personagem na série "A Paranormal", e ela se recusou a fazê-lo, dizendo que não seria realista que uma mulher, mãe de três crianças, fosse mais magra do que ela era à época. A mesma Patricia Arquette que sofreu, anos depois, ataques midiáticos por sua aparência "velha" e "descuidada".
   Quão improvável seria para uma atriz iniciante acima dos 40 anos se impôr, SE RECUSAR? Ela seria mandada de volta pra casa, e a indústria teria uma substituta para ela em três segundos.
Como Paula Hawkins continua, na citação que fiz anteriormente: "eu não sou bonita, e não posso ter filhos. O que isso faz de mim? Uma inútil."
   O que muitas pessoas não percebem, é que essa distorção de valores na indústria de entretenimento tem um impacto enorme sobre a sociedade inteira, fazendo com que o peso de tudo isso recaia e ganhe ainda mais força sobre mulheres "comuns". Nós estamos em um círculo vicioso, onde só quem perde energia E VIDA são as mulheres.
   Quando a sociedade deixará a mulher SER?